Mudanças climáticas e seus efeitos na produção de hortaliças são discutidos em workshop

Se confirmadas as previsões de pesquisadores e especialistas convidados a discutir a temática, a produção de hortaliças numa perspectiva futura de aquecimento do planeta estará numa posição de forte vulnerabilidade. Variando as exposições em termos de “cenário mais otimista” e “cenário mais pessimista”, o workshop “Efeito das mudanças climáticas na produção de hortaliças”, promovido pela Embrapa Hortaliças (Brasília-DF), nos dias 12 e 13 de novembro, apontou a necessidade de os projetos de pesquisa com olerícolas agregarem mais esse componente como possível fator limitante.

Para o pesquisador Eduardo Assad, da Embrapa Informática Agropecuária (Campinas-SP), que discorreu sobre os “Efeitos dos diferentes sistemas de manejo na manutenção dos estoques de carbono”, a agricultura é uma das poucas áreas que ainda podem “virar o jogo” – passando de emissor para sequestrador de carbono, através do uso de práticas conservacionistas, a exemplo do Sistema Plantio Direto e do Sistema de Produção Orgânica. Como principal desafio, ele apontou a ausência de fatores de emissão de gases de efeito estufa, sobretudo CO² e, principalmente, N2O para hortaliças. “Faltam, por exemplo, dados sobre hortaliças, ainda inexistentes no Inventário de Emissão de Gases de Efeito Estufa”, anotou o pesquisador, para quem “não dá para esperar muito, haja vista a ocorrência, cada vez mais frequente, de fenômenos extremos de frio e calor, com consequência direta na produção de hortaliças”.

Práticas conservacionistas também foram defendidas pelo pesquisador Carlos Clemente Cerri, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA-USP), que a respeito do “Estoque de carbono e emissões atmosféricas de gases de efeito estufa associadas ao uso do Sistema Plantio Direto”, tema de sua apresentação, defendeu a tecnologia “por representar uma grande proteção do estoque de carbono no solo”. “O manejo adotado contribui, por exemplo, para a mitigação da emissão de gases de efeito estufa, através da maior quantidade de carbono no solo”, pontuou. “A ciência é feita de verdades por vezes transitórias, mas as mudanças climáticas são uma realidade que estão a requerer ações voltadas para o seu enfrentamento”.

Da Embrapa Cerrados (Brasília-DF), a pesquisadora Arminda Carvalho alertou para a intensificação de extremos climáticos – secas, enchentes, tornados – mais frequentes, o que demandaria uma “repensada” por parte de agentes que promovem políticas públicas. “As concentrações de gases de efeito estufa estão aumentando e, por interferência humana, vêm se acentuando”. Sobre essa questão, ela traçou considerações com base no tópico “Avaliação das emissões atmosféricas de gases de efeito estufa na agropecuária”. Segundo ela, mesmo não sendo o setor da economia que mais contribui para o aumento dos gases, não pode ser ignorada a participação da agricultura. E exemplifica: “A mudança no uso do solo pode passar de uma condição de equilíbrio para uma situação de vulnerabilidade e, dependendo do manejo agropecuário, pode contribuir para maiores emissões de gases de efeito estufa, notadamente N2O na atmosfera, gás aproximadamente 300 vezes mais gerador de efeito estufa que o CO2”, avaliou Arminda. “A expansão da agricultura no Cerrado, por exemplo, deve ser repensada, precisa ter um limite”, alertou.

Incertezas e projeções

Ao abordar experiências sobre os “Impactos das mudanças climáticas sobre a demanda hídrica do meloeiro em condições do Nordeste brasileiro”, o pesquisador Rubens Gondim, da Embrapa Agroindústria Tropical (Fortaleza-CE) trouxe à tona a questão da falta de projeções mais precisas do alcance desses impactos sobre a cultura do melão, foco de projeto desenvolvido nas localidades Jaguaribe (CE) e Apodi (RN), e que exerce um importante papel na economia da região. “Existem incertezas sobre emissões futuras dos gases de efeito estufa, nas concentrações futuras desses gases e sobre as respostas climáticas a tudo isso. Necessitamos de dados mais precisos, pois o que temos hoje é o modelo global incidindo sobre o modelo regional”, acentuou.

“Projeções de mudanças climáticas para o Brasil no final do século XXI” foi o ponto comentado pelo pesquisador Wagner Soares, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que traçou alguns cenários de impactos na produção agrícola a partir de observações e levantamentos realizados pelo IPCC – Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas. De acordo com o pesquisador, em cenários projetados para todas as regiões brasileiras, temos ocorrências de eventos extremos de chuva e altas temperaturas, incremento de dias secos no verão, maior precipitação de chuvas irregulares, com intensidade crescente até o final do século. “Conforme as projeções, teremos aumento de temperatura e maior redução de chuvas no Nordeste, aumento de chuvas e altas temperaturas o Sul e no Sudeste, e eventos extremos de chuva e seca no Norte e no Centro-Oeste, com grandes impactos no Pantanal e no Cerrado”, sublinhou Soares. “As mudanças climáticas ocorrem num período mais curto do que o necessário para adaptação dos nossos ecossistemas.”

A Embrapa Meio Ambiente (Jaguariúna-SP) marcou presença no workshop com a apresentação das pesquisadoras Emília Hamada e Raquel Ghini. Conforme a exposição feita pela primeira, numa visão pessimista, o IPCC vem trabalhando com hipóteses que levam em consideração, por exemplo, o predomínio do interesse econômico sobre o ambiental – na contramão dessa tese estaria o cenário otimista. “A agricultura deve trabalhar com esses dois cenários, embora o que predomine atualmente seja a certeza de que as mudanças climáticas não são sazonais e sim uma realidade onipresente”, opina a pesquisadora, que apresentou painel sobre as “Metodologias para elaboração de mapas de cenários climáticos futuros”.

Na avaliação de Raquel, o aumento da concentração de Dióxido de Carbono ( CO²) no ar, provocando o efeito estufa, é observado em todas as medições que vêm sendo realizadas, a partir da década de 70 até os dias de hoje – e todos os seres vivos serão afetados pelo aumento da temperatura do planeta. Esse foi o fio condutor do painel “Efeitos das mudanças climáticas esperadas para o Brasil sobre a produção e doenças de hortaliças”, no qual a pesquisadora traçou um panorama sobre o futuro do cultivo das olerícolas no País. Segundo ela, os trabalhos de pesquisas com hortaliças detêm condições para garantir a continuidade da produção, embora possivelmente implicando no aumento nos custos de produção e desenvolvimento de novas cultivares mais adaptadas. “Haverá necessidade de migração de algumas cultivares para outras regiões mais frias, o que deverá afetar a produção da alface, da batata, e das brássicas, por exemplo”, avaliou a pesquisadora. “A cenoura deverá ter as práticas de irrigação reavaliadas e o tomate deverá sofrer prejuízo em todas as fases de produção”, acrescentou.

Nessa mesma linha, o pesquisador Lauro José Guimarães, da Embrapa Milho e Sorgo (Sete Lagoas-MG), discorreu sobre “Melhoramento genético vegetal visando adaptação às mudanças ambientais”, alertando para a necessidade do cuidado especial com relação à questão da tolerância às doenças por parte da área de melhoramento genético. Com base em pesquisas desenvolvidas e estudos realizados, ele garantiu que as mudanças no clima não vão interferir apenas nas plantas, mas também nos patógenos, com benefícios para os últimos. “As mudanças climáticas podem trazer condições muito propícias ao desenvolvimento de patógenos e a pesquisa tem que estar atenta a essa perspectiva”.

Enfrentamento

De acordo com o pesquisador Carlos Pacheco, pesquisador da Embrapa Hortaliças e coordenador do workshop, o contexto referente aos efeitos das mudanças climáticas caminha para um cenário global mais pessimista, onde prevalece a ocorrência de dias e noites mais quentes. E, no Brasil, a tendência é para um maior aquecimento em todas as regiões, sendo o Norte e o Centro-Oeste os mais afetados pelo aumento da temperatura.

“Enquanto centro de pesquisa com hortaliças, o caminho é desenvolver pesquisas para adaptar as cultivares às novas condições, e em alguns casos haverá um esforço maior, como a relacionada à batata, brássicas e alface, cuja produção tem na alta temperatura um fator limitante”, explica Pacheco. Conforme o pesquisador, algumas ações vistas como conservacionistas já foram incorporadas pela Unidade. “Fazemos uso da tecnologia do Sistema Plantio Direto, de manejo e conservação do solo e da água, e desenvolvemos ações corporativas ao inventariar as emissões de gases de efeito estufa provocadas pelos combustíveis fósseis e pela energia elétrica”, informou. “Também está incluída nessas ações a identificação de padrões climáticos registrados na estação meteorológica para investir em ações mais efetivas”, conclui.

Anelise Macedo

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